domingo, 11 de abril de 2010

" Aqueles dois"

Um hino ao desejo, ode à paixão, encontro do acaso ou o destino gritando amém: viva o amor! (Um resumo do que ficou). Ninguém está imune à paixão. Independente de raça, sexo, escolha, convenção. A vontade, os desejos, existem e estamos sujeitos a eles tal como flores em jardins. Tudo brota. Surge. Sente-se. O sentimento é assim... Somos reféns dele à ponto de nos entregarmos. Cumprir prisão perpétua, regime fechado, semi-aberto, aberto ou até, por fim, a tão sonhada liberdade incondicional. "Sentir", então, seria uma espécie de cela, de enclausuramento? Talvez sim. Uma cadeia excêntrica, eu diria, um sistema carcerário autônomo que só o preso administra ou deveria saber administrar. Uma pena de autogestão. Mas por que falo disso? Não sei. É que hoje vi o contrário, fui sacudido na cadeira da frente. Vi duas pessoas irem de encontro a uma paixão incomum: livres da prisão que tal desejo poderia ocasionar. Livre das convenções, dos estereótipos, da catequese dos bons costumes, sobretudo, livre de qualquer manual sobre a forma certa de se apaixonar ( Parece estranho mas esses "roteiros" existem!).
Volta e meia projetamos um amor, inventamos uma paixão, impedimos que ela surja de fato e nos tire os pés do chão. Engraçado. Hoje foi tudo às avessas. Eu me desconheci perante eles. Percebi que falta aquilo que vi simples: ARREBATAMENTO. Quando isso acontece, consequente - inconsciente, nada mais importa. Nem mesmo o lugar de trabalho, uma repartição pública, por exemplo. Poderia ser um escritório, uma igreja ou um palco de teatro. E foi. Arrebatar quer dizer Protagonizar. Você se torna principal na história. O que fica ao redor são meros adjuvantes. Um encontro de almas desertas revive em alma única, em alma coabitada. Interseção de vidas. Um oásis Caio Fernando Abreusístico.

Fica o desejo de ser arrebatado. Belo espetáculo Cia Luna Lunera. Música para os meus ouvidos, quadro para meus olhos, fogo em meus sentidos, teatro pra essa minha vida cheia de Eu, Tu, Aqueles.

3 comentários:

  1. ai... pelo seu escrito, como gostaria de ter visto! :*

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  2. Um pouco de "Aqueles dois"

    "Esvaziaram lentamente cada um a sua gaveta, a sala deserta na hora do almoço, sem se olharem nos olhos. O sol de verão escaldava o tampo de metal das mesas. Raul guardou no grande envelope pardo um par de olhos enormes, sem íris nem pupilas, presente de Saul, que guardou no seu grande envelope pardo, com algumas manchas de café, a letra de Tú Me Acostumbraste, escrita à mão por Raul numa tarde qualquer de agosto. Desceram juntos pelo elevador, em silêncio.

    Mas quando saíram pela porta daquele prédio grande e antigo, parecido com uma clínica ou uma penitenciária, vistos de cima pelos colegas todos postos na janela, a camisa branca de um, a azul do outro, estavam ainda mais altos e mais altivos. Demoraram alguns minutos na frente do edifício. Depois apanharam o mesmo táxi, Raul abrindo a porta para que Saul entrasse. Ai-ai, alguém gritou da janela. Mas eles não ouviram. O táxi já tinha dobrado a esquina.

    Pelas tardes poeirentas daquele resto de janeiro, quando o sol parecia a gema de um enorme ovo frito no azul sem nuvens no céu, ninguém mais conseguiu trabalhar em paz na repartição. Quase todos ali dentro tinham a nítida sensação de que seriam infelizes para sempre. E foram."
    Caio F.

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  3. Diante disso, manifesto: quando me perguntarem se amo, responderei que estou vivo!

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