terça-feira, 22 de junho de 2010

Novidade chegando...

TORRE DE ARRABAL

(Agosto em Salvador)
Em comemoração aos 78 anos do dramaturgo vivo mais encenado da atualidade, Fernando Arrabal, acontece em Savador no mês de agosto, o evento Torre de Arrabal, um projeto onde as linguagens do teatro, cinema e artes visuais, se encontram para dialogar sobre a arte do dramaturgo espanhol. O projeto engloba a exibição do filme "Irei como um cavalo louco" de Fernando Arrabal, apresentação de um documentário de Fernando Béllens, uma instalação de artes visuais; uma palestra do dramaturgo e o espetáculo "Torre de Babel" que estréia 11/agosto no Teatro Martim Gonçalves.




Mais do que a vinda de um ícone vivo do teatro mundial a Salvador para falar sobre sua obra e sobre o teatro mundial, Torre de Arrabal visa possibilitar a troca artística: estudantes, diretores de teatro e cineastas, que terão a oportunidade de dialogar com um mestre.





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A Torre de Babel vista de um olho só.

Certo dia estava eu, Gaspar Quintero, mais conhecido como Caolho, passando pela rua juntamente com meus dois companheiros de batalha: o aleijado e a bêbada. Quando tudo parecia perdido e os ânimos já desanimados ( o meu não, deixo claro!), eis que surge uma voz aos berros, um convite à revolução, uma porta que se abria para nós: os desalmados, os sem teto, os homens de bem. Era o grito desesperado de uma mulher, acho que a dona do castelo. Ela pedia ajuda, guerrilheiros, gente disposta a lutar. "Não tenho nada a perder", pensei. "Se ajudo uma rainha acho que ela pode me ajudar também". "Vamos ocupar!", gritei. "Nosso lema será: Comamos e bebamos que amanhã jejuaremos! Viva a Espanha!" Então entramos no castelo. Armados, atentos, prontos para tudo, dispostos a tudo.

O casarão era velho, mais velho do que eu pensava. Acho até que merecíamos coisa melhor. O teto parecia desabar, os móveis quebrados, o cheiro de mofo. Mas estávamos ali prontos para tudo, dispostos a tudo. Tinha uma gente metida, granfina, bem vestida. "Aquele lugar não era para eles", pensei. Eram fracos, medrosos, não tinham sangue nas veias. Não lhes dei importância. Acho que deviam ser hóspedes da rainha. Ela sim! Ela era imponente, guerrilheira, acreditava em nós. Eu faria sim tudo por ela. Uma mão lava a outra.

Estava com fome, fome de tudo: comida, gente, bebida, casa, fome de liberdade. Ali eu era livre. A rainha me deixou ser livre. Até nomeado Che Guevara fui! Fiquei importante! Mendigo nunca mais! As coisas foram mudando. Quiseram nos propor que ficássemos contra a Latídia. Achei estranho. Trair quem me ajudou? Mas se realmente ela for louca e cega? Já cansado de ser enganado fiquei mais atento. Não sairia ileso daquele castelo, algum proveito eu teria que ter. E tive. Fui chamado até de cavalheiro, fui reconhecido. Um conde falido me deu esse título enquanto chupava o buraco do meu olho. Já estava no lucro. Mas para garantir o meu vendi aquela gente toda no alto do castelo. Um leilão. Eram as únicas coisas que eu podia vender daquele lugar. Afinal quem compraria uma viga podre? Só me restava a carne humana mesmo.

Como alegria de pobre dura pouco, e a minha não seria diferente, o castelo veio a cair. Desabou tudo em cima de nós. Éramos todos iguais: mendigos, condes, criados. E assim, arrependido de quase ter traído a confiança daquela mulher que me deu abrigo e título de líder revolucionário, entreguei-me à sua causa. E juntamente com os outros donos do castelo construímos uma nova torre de babel. Era a hora de jejuar.

(Caolho. Meu personagem no espetáculo "Torre de Babel". Exercício de contrução do personagem)

sábado, 5 de junho de 2010

Os enamorados

Quando se fala em Goldoni- penso eu- em Itália, em Comedia dell"arte, em farsa. Foi com essas referências que curiosamente cheguei no teatro. O texto não conhecia, a história presumia mas a curiosidade me era instigante. Não sei ao certo os motivos mas estava curioso. O espetáculo começou. O cenário requintado, vermelho da paixão com lustres flutuantes fazendo o adorno da caixa cênica. Uma sala de estar, pensei. Lembrei-me do Teatro Elisabetano com suas cortinas felpudas, tapetes luxuosos, níveis altos. O figurino, mesclava antiguidade com modernidade. Um completava o outro, o conceito era o mesmo. Iluminação de sombras, tons escuros, diria finos, não sei, me parecia requintado. Entram os atores. Espero a leveza, os trejeitos farsescos, a agilidade. Estranho. Tinha um toque diferente. Surpreendente. Fiquei estranhado, estranhamento, estranhei. O corpo desenhava a fala, acompanhava o gesto, criava um novo código. A cada fala uma nova partitura física. O verbo e a ação pareciam estar colados, fixos. Uma dependência mútua. Estranhei novamente. Refleti. Aliás, não refleti. Só depois. Não dava tempo. Pouco a pouco me enamorei. A historia de amor simples, clichê, dessas em que o casal se ama mas não se entende sabe? Lembrei do Cravo e a Rosa, A Megera domada, Romeu e Julieta. Lembrei dos casais apaixonados que não se entendem ou que não querem se entender. Lembrei ainda daqueles que são impedidos de se entenderem. Enfim... Então quando eu  menos esperava, outra surpresa: luta. Isso mesmo. Os atores mais precisamente Eugênia e Fulgêncio criavam suas relações através de partituras físicas de afeto ou de raiva. Lutavam entre si. Era estranho, diferente e muito bem executado diga-se de passagem. Nossa! Que interessante, pensei. A falta de dialogo dos personagens contrastava com a simbiose orgânica dos atores. Prontidão. Foco. Agilidade. Leveza. Prontidão. Prontidão e prontidão. Gosto da forma como foi dito o texto, da forma como foi dançado o texto. O texto em si, talvez nem gostaria. Que namoro bonito o de vocês: elenco e diretor apaixonados. Saldo da noite: Enamorei! Aquele prévio estranhamento aflorou mais uma paixão. E se até Brecht provoca o estranhamento... quem sou eu pra não estranhar...

Parabéns Antônio Fábio, Parabéns Rô, Parabéns elenco. Belo espetáculo! Ousado, diferente e principalmente muito bem executado. Sai feliz da sala "requintada". Sai enamorado!

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